Alimentos livres de pragas, combustíveis produzidos a partir de micro-organismos, órgãos e tecidos humanos construídos em impressoras 3D com o uso de células-tronco. Essas são apenas algumas das possibilidades de aplicações da biotecnologia, ciência tão antiga quanto a humanidade, mas que nas últimas duas décadas vem se expandindo e ganhando cada vez mais peso no País. Não à toa, a demanda por bacharéis e engenheiros formados na área, vinculada especialmente à pesquisa, é alta e as instituições apostam na abertura de novos cursos para atender o mercado. A biotecnologia nasceu junto com os primeiros processos de fermentação na produção alimentar, principalmente na produção de pão e vinho, como explica o coordenador do curso de Engenharia Biotecnológica da Universidade Estadual Paulista, Dario Abel Palmieri. “Hoje, ela é o conjunto de informações de elementos biológicos, que podem ser manipulados de alguma maneira com aplicação que seja útil para alimentação ou para a indústria.” Os organismos vivos — daí vem o significado da palavra bio — podem ser manipulados com efeito benéfico, como na produção de alimentos funcionais, de medicamentos.
Quem nunca ouviu falar nos transgênicos ou nos organismos geneticamente modificados? A biotecnologia é figura fundamental por trás dessas transformações na área da agroindústria. Hoje, em laboratório, os biotecnologistas conseguem controlar a patogenicidade da bactéria inutilizando ou silenciando o gene que causa esse problema. Os transgênicos recebem transferência ou sofrem alterações no DNA. O milho BT, por exemplo, recebe na fase adulta o gene que vem de um bacilo e começa a produzir proteína gerada pelo agente. A modificação é mortal para a lagarta que come a folha da planta. Mas as aplicações da biotecnologia vão além. “Tenho quatro alunos que estão construindo uma impressora 3D. Hoje, com impressora 3D você consegue construir tecidos e órgãos usando células-tronco. Tem pesquisadores recompondo tecidos como orelhas, por exemplo”, afirma Palmieri. A aplicação engenhosa associa computação e tecnologia da informação com a biotecnologia. Na indústria, o biotecnologista também consegue desenvolver desde vacinas, anticorpos e outras moléculas de interesse farmacêutico, até aumentar a produção de biocombustíveis criando micro-organismos capazes de degradar a sobra da cana-de-açúcar e que era inutilizada. Dados de um mapeamento feito em 2011 pela BRBiotec dão conta de que 40% das empresas de biotecnologia estão no Estado de São Paulo, e o mesmo percentual atua na área de saúde.
LNBio, em Campinas, é referência na América Latina
Laboratório ligado ao CNPEM é aberto para receber pesquisadores e tem tecnologia para qualquer trabalho na área
Campinas tem um dos mais importantes centros de pesquisa e aperfeiçoamento na área de biotecnologia do País. O Laboratório Nacional de Biociências (LNBio), ligado ao Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), é referência não apenas na cidade como na América Latina.
Além de pesquisadores capacitados e de equipamentos de última geração, capazes de fazer biotecnologia de ponta, o laboratório é aberto e recebe profissionais do mundo inteiro. Nos últimos três anos, 1.927 pesquisas de usuários externos foram realizadas nos equipamentos do Laboratório. “O que tem de mais avançado do que se está fazendo no mundo o nosso laboratório tem condições de fazer”, afirma a pesquisadora Andrea Balan Fernandes.
O laboratório tem quatro grandes áreas de estudo, voltadas para pesquisa básica, mas com a proposta de chegar sempre a um produto final. Uma delas é a biologia do câncer, que estuda as várias proteínas associadas ao desenvolvimento ou ativação de células proliferativas, com foco na descoberta de novas intervenções terapêuticas.
O laboratório estuda também as doenças negligenciadas, como tuberculose, leishmaniose e doença de Chagas.
Além disso, estuda a biologia do sistema cardiovascular e a interação entre planta e patógeno.
“O objetivo é sempre chegar a algo que possa ser aplicado: o desenvolvimento de uma droga para controlar a doença, de um bloqueador da interação entre o patógeno e o hospedeiro”, explica.
Formada em biologia e com pós-graduação, doutorado e pós-doutorados na área de biotecnologia, Andrea tem uma atuação extensa na área.
Ela já trabalhou com o melhoramento de linhagemó de leveduras para produzir cerveja de melhor qualidade. Atualmente, coordena um grupo de alunos de doutorado e pós-doutorado no LNBio e faz diversas pesquisas. Uma delas é com um grupo de proteínas transportadoras da Mycobacterium tuberculosis. “A gente descobriu que as drogas usadas no tratamento muitas vezes não fazem efeito porque a bactéria tem como se fosse uma bomba de extrusão. Reconhece que a medicação não faz parte do patgeno e manda para fora, causando resistência a antibióticos e drogas.” A ideia é desenvolver um sistema para bloquear o transporte da droga para fora. (IM/AAN)





